
“Queremos viver em plenitude. Indignar-se, abalar-se e manifestar-se, veementes, diante das injustiças e das violências com as quais nós, negros, convivemos diuturnamente nos diferentes espaços e territórios.”
Com essas palavras, a reitora da UNEB, Adriana Marmori, declarou abertos o X Congresso Baiano de Pesquisadores(as) Negros(as) (X CBPN) e V Congresso de Pesquisadores(as) Negros(as) do Nordeste (V Copene-NE), na tarde de ontem (3), em sessão solene no teatro da universidade, no Campus I, em Salvador.
Sediadas na UNEB, essas edições dos eventos, cuja programação se prolonga até o próximo dia 7, trazem reflexões sobre a resistência negra com tema “Malês, 190 anos: legado ancestral e a continuidade das lutas“. As atividades estão sendo transmitidas ao vivo pelo canal da TV UNEB no YouTube.

Os congressos reúnem pesquisadores, docentes, estudantes e ativistas de diferentes regiões do país, colocando no centro dos debates a importância da preservação da memória das lutas negras e das riquezas culturais, patrimônios do povo negro.
“Aqui, na UNEB, reafirmamos nossa presença, nossa existência, nossa exigência de respeito e nossa determinação em continuar construindo”, disse Sandra da Silva, presidente da Associação de Pesquisadores(as) Negros(as) da Bahia (APNB), entidade organizadora dos eventos, em parceria com a Associação Brasileira de Pesquisadores(as) Negros(as) (ABPN) e o Centro de Estudos Africanos e da Diáspora Africana nas Américas (AfroUneb).
Em sua fala, Adriana Marmori também reafirmou o compromisso institucional da UNEB com a luta antirracista e pelo direito do negro de ocupar os espaços acadêmico e lutar por uma vida mais digna. “Na academia, na ciência engajada, encarnada imbricada e contextualizada, produzida em defesa do povo preto, nos fóruns, seminários, congressos, nos componentes curriculares de muitos cursos, nas salas de aula. Mas, infelizmente, apesar de tantos esforços, o racismo estrutural ainda existe“, alertou a reitora.

“Chegamos à era da barbárie, em que as vidas humanas se confundem com objetos descartáveis. É a cultura do ter sobrepondo-se à cultura do ser. É preciso resistir, sempre. E vamos resistir. Não somos descendentes de escravos, somos descendentes de seres humanos que foram escravizados“, completou Adriana Marmori.
Além da reitora, a mesa solene de abertura contou com a participação do presidente da ABPN, Adilson dos Santos, da presidente da APNB e uma das coordenadoras dos eventos, Sandra da Silva, da coordenadora do AfroUneb, Suely Santana, da também coordenadora dos congressos, Irenilza Oliveira, e da deputada estadual Olívia Santana. Outros convidados compuseram a ala de honra da abertura, como a vice-reitora Dayse Lago e a pró-reitora de Ações Afirmativas (Proaf), Dina Rosário, da universidade.
Enfrentamento ao racismo
Nas diferentes palestras e mesas do X CBPN e do V Copene-NE, tem sido reiterada a questão de como o povo negro tem resistido historicamente a todo jugo imposto pelo sistema racista, nas lutas contra a discriminação racial, política, educacional, econômica, social, filosófica, epistemológica e cultural.

A capacidade intelectual dos negros ainda é constantemente questionada. Contra essa visão eurocêntrica do conhecimento, falou a presidente da APNB: “Frequentemente, temos nossas capacidades cognitivas questionadas. As pessoas nos observam e, mesmo sem expressarem verbalmente, transmitem sentimentos de repulsa por meio da linguagem corporal”, denunciou Sandra da Silva, acrescentando que “a existência de uma associação de pesquisadores composta por doutores e pós-doutores, com reconhecimento nacional e internacional, que se dedicam a trazer o coletivo, a população, para o centro, é fundamental”.
Reforçando essa questão, o presidente da ABPN lembrou que “mesmo com títulos e reconhecimento, ainda enfrentamos o racismo“. “A estrutura deste país, infelizmente, impõe a desigualdade, a diferenciação e a exclusão. Por isso, ao celebrarmos a Revolta dos Malês, estamos também combatendo as barreiras que nos impedem de viver, como o genocídio constante da população negra e pobre”, afirmou Adilson dos Santos.
Na conferência de abertura, o professor da UNEB Wilson Mattos alinhou-se à perspectiva da importância dos congressos como “espaço de referência simbólica e prática, que incentiva a formação, o acesso à universidade e o destaque profissional das pessoas negras”.

“A população negra não teve ou não tem, em sua grande maioria, oportunidade de frequentar espaços como este, seja de maneira formal ou informal. Como pioneira na adoção das cotas raciais, a UNEB configura-se como modelo para o negro de que é possível ingressar aqui, investir na formação profissional, se destacar no seu campo de atuação”, avaliou Wilson Mattos.
A ampla programação inclui conferências, mesas-redondas, grupos de trabalho, lançamento de livros, apresentações artísticas e atividades culturais, reunindo nomes de destaque da academia e de organizações sociais do Brasil e do exterior.
Com trajetória consolidada ao longo de quase duas décadas, o CBPN e o Copene-NE são referências na produção científica de pesquisadores negros e pesquisadoras negras sobre o povo negro no Brasil, articulando discussões sobre educação, saúde, cultura, comunicação, tecnologia, meio ambiente e políticas públicas.
Texto: Marcus Gomes/Ascom, com edição de Toni Vasconcelos/Ascom.
Fotos: Danilo Oliveira/Ascom.


































