“Eu sou a preta que não abaixa a cabeça. (…) Hoje tudo mudou: eu sou o poder, eu sou a liberdade, eu sou a verdade. Eu sou a senzala que aprendeu a ler, que estudou.”
Esses versos, de Mona Kizola, fizeram parte do recital que abriu as atividades do Circulô – Perspectivas da Juventude Negra na Garantia dos Direitos Humanos, na noite dessa sexta-feira (14), no Teatro UNEB, Campus I, em Salvador. Participaram também do recital das “poetisas marginais” – como elas se denominam – Negra Winnie e Marina Lima.
Essa primeira edição do Circulô, uma realização do Coletivo Resistência Preta em parceria com a Reitoria e a Pró-Reitoria de Ações Afirmativas (Proaf) da UNEB, reuniu dezenas de jovens lideranças e artistas de comunidades e movimentos negros de Salvador e São Paulo, no campus da universidade entre os dias 14 e 16.
A extensa programação contou com ações formativas, rodas de conversa, oficinas, slam (competição de poesia falada) e “batalhas” de MCs (mestres de cerimônia).
Em sua saudação na sessão de abertura, a reitora Adriana Marmori parabenizou os organizadores pela iniciativa e agradeceu a participação dos jovens e convidados: “É uma grande alegria para a UNEB sediar um evento tão importante para as juventudes – assim mesmo, no plural, porque somos muitos e muitas”.
“Estamos engajados na luta contra a vulnerabilidade da juventude preta. A UNEB e as universidades precisam estar engajadas nessa luta, para trazer o protagonismo negro. Estamos inteiramente de acordo com a máxima ‘nada por nós sem nós’. E para assegurar todos direitos humanos a esses jovens: direito à vida, primeiro, mas também direito à educação, ao trabalho, à saúde, à cultura, todos os direitos, enfim”, destacou Adriana Marmori, citando os elevados índices de homicídios de jovens negros no país.
Afirmando que o “racismo estrutural precisa ser denunciado diuturnamente em todos os espaços”, a reitora enfatizou também a questão de gênero: “Como mulher, lembro que, nesse cenário de violências, a cada duas horas uma mulher é morta neste país – em sua maioria mulheres pretas. Acredito que, sim, vamos romper esse ciclo nefasto e perverso”.
Na avaliação de Adriana Marmori, “essa ruptura se dá pela liberdade de expressão, se dá por uma outra relação social e politica, se dá pela inserção fundante da juventude negra em todas as ações e espaços, sobretudo a partir da garantia das ações afirmativas – em que a UNEB foi pioneira no país –, e se dá pela formação da sociedade: aí a universidade pública tem papel fundamental no processo educativo. Por isso, eventos como esse são muito importantes”.
Histórico de inclusão e diversidade
Além da reitora, participaram da mesa de abertura do Circulô Dhay Borges, coordenador geral do Coletivo Resistência Preta, Tatiane dos Anjos, representante da Secretaria estadual de Promoção da Igualdade de Racial (Sepromi), Anderson Alves, egresso da UNEB e representante da Coordenadoria Geral de Políticas para Juventude do estado, Sara Sacramento, do Movimento Negro Unificado (MNU) na Bahia, Dudu Ribeiro, da Iniciativa Negra por uma Nova Política sobre Drogas, Jade Andrade, do Coletivo de Juristas Negras, Ademário Costa, do afoxé Filhos de Gandhy, Marcos Almeida, do Instituto para um Mundo Melhor (Imel) e Clarisse Paradis, do sindicato dos professores das instituições federais de ensino superior da Bahia (Apub). A pró-reitora de Extensão (Proex) da UNEB, Rosane Vieira, também prestigiou o evento.
Responsável por coordenar, junto com sua equipe, a realização e acolhimento dessa primeira edição do Circulô, a pró-reitora de Ações Afirmativas (Proaf), Dina Rosário, agradeceu a todos que colaboraram para o êxito do evento.
“A UNEB foi a primeira universidade do Brasil a implantar uma política de cotas de forma autônoma, e foi a primeira universidade também a criar uma pró-reitoria totalmente dedicada às ações afirmativas. Esse histórico de inclusão e diversidade da nossa UNEB faz com que seja muito caro para nós a abertura do espaço universitário para a articulação política dos povos e comunidades populares da Bahia”, disse Dina Rosário.
Segundo a pró-reitora, “a UNEB se fortalece e sobrevive a partir do diálogo e, acima de tudo, da aprendizagem com o nosso povo. Por isso, acolhemos o Circulô e a demanda do Coletivo Resistência Preta”.
Agradecendo à universidade pelo acolhimento, o coordenador geral do Coletivo, Dhay Borges, contou que “sempre colocamos como foco a educação e pensamos neste espaço da UNEB como um quilombo que o nosso povo precisa entrar”.
“Decidimos que é muito importante para a juventude preta ocupar este espaço, estamos trazendo a periferia para cá. Essa juventude precisa ser respeitada. Para isso, dialogamos com a reitora Adriana, que sempre nos recebeu de portas abertas. O Circulô é para hoje, para ontem e para sempre!”, concluiu Dhay Borges.
O projeto Circulô foi criado com o objetivo de capacitar e empoderar jovens negros das regiões periféricas, fortalecendo sua consciência crítica e habilidades políticas.
Texto: Toni Vasconcelos/Ascom. Fotos: Danilo Oliveira/Ascom.