“Comecei a escrever para curar uma ferida. Mas a beleza a literatura é porque ela é maior que nós, é algo que não controlo.”
Assim o escritor moçambicano Mbate Pedro tentou responder a uma estudante sobre o que o motivou a enveredar pelos caminhos da literatura, ele que é médico em seu país e vem se destacando no atual campo literário africano.
Mbate participou hoje (10) à tarde do evento “Debaixo do silêncio que arde – Conversa sobre a poesia moçambicana contemporânea”, no Auditório Milton Santos, no Campus I da UNEB, em Salvador.
O encontro faz parte de mais uma edição do projeto Conversa com Escritor, realizado pela Cátedra Fidelino de Figueiredo da universidade, com o apoio da Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública e do Camões – Instituto da Cooperação e da Língua Portuguesa.
Na conversa com estudantes e docentes da UNEB e convidados, Mbate disse que sua geração de escritores de Moçambique não aceita o modelo estereotipado que se cultivou em países europeus e americanos a respeito da literatura africana, vista como “exótica, centrada nas tradições, na oralidade”.
“Claro que nossa literatura trará sempre as marcas da nossa cultura, da nossa história. Mas queremos desconstruir esse estereótipo da oralidade, nos interessa mais a multiculturalidade, olhar do local para o global”, salientou.
Na avaliação do escritor, na contemporaneidade as fronteiras estão diluídas e a universidade precisa captar essas mudanças. “Penso que a universidade está falhando nisso, usando dogmas antigos nos estudos literários. Nós, moçambicanos, africanos, usamos os mesmos materiais de escrita que usam os alemães, os ingleses, os brasileiros. Nossa literatura é muito rica”, afirmou.
Durante o evento, o escritor apresentou seu mais recente livro, Vácuos, obra finalista do prêmio Oceanos (2018) e que será lançada na 17ª Festa Literária Internacional de Paraty (Flip), que começou hoje e se estende até domingo (14).
Tendo preferência pela poesia, Mbate Pedro é autor de outros quatro livros: O mel amargo (2006), Minarete de medos e outros poemas (2009), Debaixo do silêncio que arde (2015) e Os crimes montanhosos (2018).
A presidente da Cátedra Fidelino de Figueiredo, Rita Aparecida Santos, agradeceu a participação do escritor e a presença do público: “Estamos muito felizes, Mbate foi o primeiro escritor africano que a Cátedra conseguiu trazer aqui na UNEB”.
“Tradicionalmente os escritores portugueses e africanos quando vêm ao Brasil só passam pelo Rio de Janeiro, São Paulo, Brasília, Rio Grande do Sul. Esse evento é mais um esforço de todos nós de mudar essa rota e trazer também para cá autores reconhecidos. A academia é o lugar das utopias e esperanças”, enfatizou Rita Aparecida.